País pode estar diante de um dos maiores desastres ambientais de sua história.

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Mais de 300 praias atingidas por um derramamento de petróleo, afetando 9 estados e quase 110 municípios. A área contaminada se estende por 2.500 km e o derramamento foi considerado o maior em extensão nos últimos 30 anos, segundo pesquisa da Faculdade de Oceanografia da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro – https://www.oceanografia.uerj.br/).

Os estados afetados por esse desastre ambiental são: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe. Este é o balanço mais recente do governo brasileiro sobre um dos maiores estragos ao ecossistema já ocorridos no País. As manchas são decorrentes da mesma substância em todos os locais: petróleo cru. O fenômeno tem afetado a vida de animais marinhos e causado impactos nas cidades litorâneas sem precedentes.

Inicialmente, o Ibama divulgou que as primeiras manchas apareceram em 2 de setembro nas cidades de Ipojuca e Olinda, em Pernambuco. Em atualizações mais recentes, o instituto concluiu que os primeiros registros nas praias surgiram em 30 de agosto na Paraíba, em Tambaba e Gramame, no município de Conde, e na Praia Bela, em Pitimbu. Já no dia 1o. de novembro, as investigações apontam que a primeira mancha no oceano foi registrada em 29 de julho, a 733 km da costa paraibana.

No dia 22 de outubro, o Governo Federal reconheceu a emergência em seis das 12 cidades da Bahia atingidas pelas manchas de óleo: Camaçari, Conde, Entre Rios, Esplanada, Jandaíra e Lauro de Freitas. Com isso, recursos federais passaram a ser liberados para as cidades que, até então, têm custeado a limpeza das praias.

Em 18 de outubro, o Ministério Público Federal (MPF) dos nove estados do Nordeste moveu uma ação conjunta pedindo que a Justiça Federal obrigue a União a acionar em 24 horas o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo, com multa diária de R$ 1 milhão em caso de descumprimento da ordem.

De acordo com o Grupo de Avaliação e Acompanhamento (GAA), formado pela Marinha do Brasil (MB), Agência Nacional de Petróleo (ANP) e Ibama, foram empregados os seguintes recursos:

3,1 mil militares da Marinha

26 navios–22 da Marinha e 4 da Petrobras

6 helicópteros – 2 da Marinha, 2 Ibama e 2 da Petrobras

7 aeronaves – 6 da Força Aérea Brasileira (FAB) e 1 do Ibama

5 mil militares do Exército Brasileiro (EB)

140 servidores do Ibama

40 do ICMBio

440 funcionários da Petrobras

Investigações

As investigações mostram que:

Em 15 de julho, o navio-tanque grego suspeito atracou no Puerto José (Venezuela) e foi carregado com petróleo durante três dias;

O sistema AIS da embarcação confirma a passagem pelo ponto de origem do óleo;

O presidente Jair Bolsonaro disse suspeitar de um incidente criminoso e que a investigação é “bastante complexa”. Sem citar nome, afirmou que existe um país “no radar”.

“Pode ser algo criminoso, pode ser um vazamento acidental, pode ser um navio que naufragou também. Agora, é complexo. Temos, no radar, um país que pode ser o da origem do petróleo e continuamos trabalhando da melhor maneira possível”, disse Bolsonaro.

De acordo com o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, o petróleo seria de origem, “muito provavelmente, da Venezuela”, atribuindo a informação a um relatório elaborado pela Petrobras.

No dia 23 de outubro, Salles afirmou, em um pronunciamento oficial, que o presidente Jair Bolsonaro autorizou o governo federal a fazer uma solicitação formal à Organização dos Estados Americanos (OEA) para que a Venezuela se manifeste sobre o tema.

O navio grego Boubolina zarpou em 18 de julho e carregou 1 milhão de barris de petróleo na Venezuela. As informações sobre os detalhes do navio, sua carga e trajetória foram fornecidos pela agência de geointeligência Kpler com base nos dados da Operação Mácula, desencadeada pela Polícia Federal. A embarcação Bouboulina passou a oeste da Paraíba em 28 de julho, segundo um porta-voz da agência.

O monitoramento de imagens de satélite da costa brasileira para investigar a origem das manchas de óleo no Nordeste não mostra indícios da substância na superfície marinha. O resultado da análise do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) reforça a teoria de que o óleo não veio boiando pelo oceano até atingir as praias, mas que estava submerso.

Em 7 de outubro, Sergipe decretou situação de emergência e recomendou a população a não utilizar as praias.

Oceanógrafos, químicos e autoridades estaduais avaliam o impacto da movimentação da mancha pela costa do Nordeste. Para o Ministério Público Federal, o impacto do derramamento de óleo tem “proporções terríveis”. Um relatório mais recente do Ibama aponta a morte de 81 animais em decorrência do vazamento.

Dados de tráfego marítimo, por exemplo, indicavam inicialmente mais de mil embarcações trafegando na região onde possivelmente teria ocorrido o vazamento. Mas a investigação afunilou essa soma para 30 navios-tanque.

Além da Polícia Federal, as investigações envolvem também Marinha, Ministério Público, Ibama, Agência Nacional do Petróleo, a Universidade Federal da Bahia, Universidade de Brasília, Universidade Estadual do Ceará e a Interpol.

Responsabilização judicial

Existem duas esferas de responsabilização neste caso: civil e criminal. No caso da responsabilização civil, o objetivo do Brasil será buscar indenização para cobrir todos os danos econômicos e ambientais, de curto e longo prazo, provocados pelo vazamento.

Já no âmbito criminal, será preciso identificar se houve dolo ou culpa, ou seja, se as pessoas envolvidas tiveram a intenção de cometer aquele crime ou assumiram o risco de que esses danos ocorressem.

Um relatório da Petrobras mostra que resíduos são resultantes da mistura de óleos do tipo extraído na Venezuela. Nestes casos, o responsável principal costuma ser o dono da embarcação responsável pelo incidente. O capitão do navio também pode ser punido, especialmente criminalmente, já que era o responsável pela embarcação.

Danos ambientais

Para minimizar os danos, instituições se uniram para ajudar no cuidado com a fauna marinha, como retirar o excesso de óleo das mucosas (olhos, narinas, bico e cloaca) e oferecer antitóxico (carvão ativado por via oral), sondas com protetores gástricos, renais e hepáticos e por fim, a lavagem.

Em áreas de lama como os mangues, com pouca movimentação de água e sedimentos mais finos, é mais difícil fazer a limpeza.

O petróleo causa impacto ao meio ambiente e seres humanos. O óleo prejudica inicialmente as algas e outros microrganismos, os quais servem de alimento para organismos maiores (peixes, aves, mamíferos, tartarugas).

Por conta dos riscos, o Ibama produziu uma cartilha para que as prefeituras manejem o material que vem sendo encontrado. Entre as recomendações está a de que, “em hipótese alguma, o óleo pode ser enterrado ou misturado com outros tipos de resíduos”.

Uma guerra comercial e sanções econômicas impostas pelos EUA com relação ao Irã e a Venezuela estão levando a um aumento de custo logístico, provocando o crescimento do número de navios-tanque trafegando em alto mar sem rastreamento. É cada vez mais recorrente a prática de se desligar os transmissores para que os navios não possam ser rastreados por satélite a fim de burlar as barreiras e tarifas. Trata-se da modalidade “off transponder” que configura uma verdadeira frota crescente de “petroleiros piratas”.

As novas táticas empresariais de transporte e logística marítima (off transponder e ship-to-ship), que decorrem das novas estratégias nacionais de guerra comercial (com sanções e embargos), podem ter alguma relação com o recente caso de vazamentos ou derramamentos de óleo que atingiu a costa do nordeste brasileiro.

Se o vazamento tiver acontecido durante uma transferência clandestina de óleo entre navios não é possível saber se a quantidade encontrada é a total ou se ainda há mais óleo por aparecer. Isso porque a capacidade de um tanque de navio-petroleiro pode ser de cerca de 3 mil toneladas de óleo. Além disso, em contato com a água o material pode entrar em processo de emulsificação e aumentar o seu volume em até quatro vezes, chegando a 12 mil toneladas, sem considerar a absorção de areia que pode torná-lo ainda mais pesado.

Manchas de óleo na costa nordestina

A cada 10 locais atingidos, 3 voltaram a apresentar manchas após limpeza por causa da maré. Em outros, o que foi visto foram fragmentos já sólidos.

Para a Federação Internacional de Poluição por Petroleiros (ITOPF, na sigla em inglês), “a melhor técnica aqui é a limpeza manual, para ser seletivo e reduzir o dano ambiental, considerando a natureza do óleo e dos substratos contaminados. Máquinas como tratores podem ser usadas onde for possível, mas é preciso levar em consideração os possíveis efeitos no meio ambiente, inclusive em ninhos de tartarugas”.

A praia que mais sofreu com grandes resíduos de óleo, segundo os balanços do Ibama, foi Jandaíra, na Bahia. A localidade foi a que mais vezes apareceu nos relatórios com o status que equivale a manchas maiores que 10% da praia. Ao todo, em 18 relatórios do Ibama algum ponto dessa praia, que fica próxima à divisa com Sergipe, apareceu com manchas grandes.

Meio ambiente em colapso

Geocientistas e biólogos explicam como os componentes químicos do óleo são capazes de matar espécies marinhas, impossibilitar pesca e turismo e causar graves doenças, como câncer, nos seres humanos.

O pesadelo ambiental que o Nordeste brasileiro vive provavelmente se estenderá pelos próximos anos. O petróleo derramado no oceano Atlântico atinge o litoral há quase 60 dias e tem potencial para danificar, em alguns casos de forma permanente, tanto o ecossistema marinho como a economia local e a saúde humana.

Alguns especialistas afirmam que o Brasil já vive a maior tragédia ambiental de sua história. Segundo eles, o nível de contaminação química do petróleo é gritante, altíssima. Em águas isso se torna ainda pior, porque é conduzida para outros locais por causa das correntes marinhas. Essa é a maior preocupação.

O pesadelo ambiental do Nordeste ameaça pescadores e o PIB do turismo. Até agora 4,5 mil toneladas de óleo foram recolhidos das praias. Somados com a areia da praia que é retirada junto, são 27 mil barris.

Além dos animais afetados e espécies que já correm risco de extinção, o petróleo pode também causar danos nos recifes de corais, ecossistemas ricos em biodiversidade que abrigam diversas espécies de crustáceos, algas, peixes, entre outras.

Diversas praias foram classificadas como impróprias para banho e estudos estão sendo realizados para avaliar o impacto do óleo nos peixes da região e no seu consumo. A longo prazo, o contato de seres humanos com o petróleo no mar e nas praias tem alto potencial cancerígeno e pode causar doenças ao sistema nervoso central.

Moradores deixaram de trabalhar para recolher os resíduos nas praias e o derramamento além de afetar o meio ambiente, impactará também profundamente a economia local. Para piorar, não há nenhum sinal de que as manchas estão rareando ou retrocedendo.

Os animais marinhos podem ser afetados tanto pela ingestão da substância quanto pelo contato com líquido que gruda e compromete a locomoção.

O projeto Tamar suspendeu a soltura de filhotes. A quantidade de óleo em praias de SE e da BA foi “tão significativa” que 600 filhotes nasceram e não foram liberados.

Um peixe-boi monitorado por biólogos de Sergipe pode ser transferido para evitar a contaminação. Há temor de que a contaminação afete a reprodução de baleias.

Caso seja encontrado algum animal com óleo, a orientação é que sejam acionados imediatamente os órgãos ambientais para adotar as providências necessárias. O animal não deve ser lavado nem devolvido ao mar antes da avaliação de veterinário, de acordo com o Ibama.

O Instituto Chico Mendes de Conservação de Biodiversidade (ICMBio) anunciou a suspensão para visitação do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. A medida será válida por três dias, e foi determinada após a detecção de manchas de óleo na região.

A proibição ao acesso do público permitirá atividades de prevenção, controle e remoção do óleo, além de evitar riscos à saúde pública. A decisão pode ser prorrogada ou extinta, dependendo do eventual aparecimento de novas manchas de óleo.

Limpeza das praias

Segundo levantamento do Ibama, as localidades são divididas em 4 categorias:

1. Oleada com manchas: a porcentagem da cobertura de óleo no local analisado varia de 11% a 50%;

2. Oleada com vestígios/esparsos: a porcentagem da cobertura de óleo no local pode ser inferior a 3. 1%, chegando a, no máximo, 10%;

3. Não observado: localidades onde o óleo não era mais visível na última análise;

4. Em limpeza: locais que estão em processo de limpeza, seja pelas autoridades, seja pela população.

Além de prestar atenção ao status das praias, é importante verificar a data da última análise do Ibama – informação que também consta nos balanços regulares publicados pelo órgão.

Isso porque praias registradas com status “não observado” podem voltar a sofrer com manchas de óleo por ação das marés. Foi o que ocorreu em Sergipe, onde todas as 17 praias apresentaram reincidência da substância após serem limpas.

Algumas das praias atingidas podem ser consideradas próprias para banho. Isto ocorre porque as manchas apareceram em forma de óleo quase sólido, ou seja, já com efeitos do clima, da luz e do sal. Assim, o óleo nem sempre afeta os relatórios de balneabilidade das autoridades estaduais.

FONTES:

Reuters

Associated Press

BBC

Bloomberg

Estadão

Folha de S. Paulo

Veja

Record TV

TV Globo

Portal G1

Portal R7